Sonho

Fazes um puzzle. Que é igual todas as noites, sendo diferente todas as vezes. E todas as vezes as peças encaixam. Bem ou mal, encaixam. E falta sempre uma peça. A mesma peça. Mesmo quando o puzzle muda, a peça que falta é a mesma. Estás horas nisso. Ou, se calhar, não. Se calhar, são fracções de segundo. Fragmentos, como as peças. Pegas no puzzle e encaixas. Perdes o puzzle. Reencontras o puzzle e fazes e constróis e procuras. E falta sempre a mesma peça. Às vezes, chega a parecer-te que a peça que falta é, afinal, outra. Mas não. És tu que sonhas dentro do teu próprio sonho. E é já uma peça que falta à peça que te falta. Noite após noite. O puzzle não te larga. Nem a falta que te faz a peça. Adias o sonho para outra noite. Tentas adiar o sonho, mas o sonho não se afasta. Não te deixa respirar. E sonhas que podes trocar aquela peça por outra peça. E sonhas que, afinal, há-de haver por ali uma peça que, não sendo a peça, te preenche o vazio. Mas és já tu a sonhar outro sonho. Ou então outro puzzle que entra no teu sonho. Já baralhas puzzles. Baralhas sonhos.
E acordas. Arrumas o puzzle na caixa. Quando a noite voltar a cair, voltas a procurar a peça. Sempre a mesma peça.





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